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Frei João José Pedreira de Castro

Nascido em 26 de junho de 1896, em Petrópolis, no palacete construído pelo seu pai (ainda hoje existente, na Rua Monsenhor Bacelar n. 297), João José Pedreira de Castro — mais tarde conhecido como Frei João José — emergiu de uma família de notável tradição intelectual e religiosa. Seus pais, Jerônimo de Castro Abreu Magalhães e Elisa de Bulhões Pedreira Magalhães, pertenciam a linhagens distintas, entrelaçando as heranças dos Pedreira, com raízes em Viana do Castelo, Portugal, e dos Castro, de origem ibérica. Essa fusão de culturas e valores influenciou profundamente a formação de Frei João José, moldando seu caráter e vocação: era paciente, meticuloso, de uma nobreza de virtude e trabalho apostólico inigualáveis. Na sua cultura, distinção e interesse pelas coisas de Deus se assemelhou extremamente a seus pais, falecidos em odor de santidade.

Demonstrando, assim como todos os seus irmãos, pendor vocacional, aos 17 anos, ingressou na Escola Apostólica dos Jesuítas em Itu, São Paulo, onde permaneceu de 1910 a 1912. Em 1913, transferiu-se para o Colégio Seráfico dos Franciscanos em Blumenau, Santa Catarina, iniciando sua jornada na Ordem dos Frades Menores. Recebeu o hábito em Rodeio, pelas mãos do Frei Policarpo Schuhen em 17 de janeiro de 1914, e professou seus votos simples exatamente um ano depois. Após estudos filosóficos em Curitiba, fez os votos solenes em 1918 pelas mãos do então Guardião, mais tarde Bispo de Campanha, Dom Inocêncio Engelke.

Dom João Francisco Braga lhe conferiu ordens menores a 02 de fevereiro de 1918 e o subdiaconato no dia seguinte, em Curitiba. Passou então a residir no convento de sua terra natal, Petrópolis, onde fez os estudos teológicos, recebendo o diaconato a 26 de outubro de 1918, de Dom Agostinho Francisco Bennassi, Bispo de Niterói. Com a dispensa de cinco meses sobre a idade canônica, foi ordenado presbítero pelo mesmo Sr. Bispo em Petrópolis, a 18 de abril de 1920. Em atenção aos seus talentos e inclinações, foi enviado a Roma para estudo de Ciências Bíblicas. Não se deu bem na Cidade Eterna, onde permaneceu apenas de 1º de outubro de 1920 até 1º de agosto de 1921.

Seguiu para Munique, Alemanha, onde estudou sob a orientação do renomado professor Goetzberger e onde permaneceu até 25 de julho de 1924. Durante esse período, foi diagnosticado com diabetes em estado avançado, recebendo prognóstico de vida limitado. Terminados seus estudos lecionou até 1924 no Colégio Brasileiro Franciscano de Moresnet, na Bélgica, onde provavelmente teve contato com os originais da Bíblia de Maredsous.

Retornando à Petrópolis por volta de 1925, continuou o magistério, sendo professor de Ciências Bíblicas na Faculdade Franciscana durante 25 anos, formando mais de 300 padres, dentro deles o futuro Cardeal de São Paulo: Dom Evaristo Arns.

De 1927 a 1950, lecionou Ciências Bíblicas no Teologado de Petrópolis, influenciando gerações de sacerdotes com sua erudição e profundidade espiritual. Sua metodologia destacava-se pela utilização direta dos textos sagrados, dispensando livros auxiliares, e por uma abordagem que mesclava rigor acadêmico com profunda espiritualidade.

A 30 de março de 1951 foi transferido para São Paulo, onde fundou o Centro Bíblico em 1956 e iniciou um curso de Sagrada Escritura por correspondência, alcançando participantes em todo o Brasil. Nesse período, também colaborou na tradução da Bíblia para o português junto ao Frei Paulo Avelino de Assis (colaboração que ocorreu, embora não declarada), cuja publicação foi efetivada pela Editora Ave Maria, a partir da já citada versão dos monges de Maredsous. A editora, pertencente aos Missionários do Coração de Maria, levou a termo um sonho alimentado pelo frei e inspirado pela encíclica de S.S. Pio XII chamada Divino Afflante Spiritu, que recomendava novas traduções, mais rigorosas e de impacto mais amplo, da Sagrada Escritura, no propósito de fazer divulgar intensamente o Santo Evangelho. Conforme consta na introdução da Bíblia Ave-Maria, havia no Brasil, especialmente, carência de novas edições e facilidade de famílias humildes adquirem e lerem a bíblia, uma vez que as traduções que circulavam no Brasil eram portuguesas, de autoria ou do Rev. Pe. Soares (excelente, aliás) ou do Rev. Pe. Figueiredo. De fato, após o lançamento da Ave-Maria, dezenas de milhares de bíblias foram vendidas em menos de um ano, o que representou um número inaudito.

Sua atuação incansável na promoção do estudo bíblico o levou a percorrer o país, realizando as chamadas "Semanas Bíblicas", com destaque para janeiro de 1959, quando proferiu 87 conferências em apenas 23 dias. Em reconhecimento a seu trabalho, foi aclamado como o "Pioneiro do atual Movimento Bíblico no Brasil" durante o Congresso Nacional da Bíblia em 1961.

Dentre muitas das suas criatividades, pode-se destacar a criação do Grêmio Rogério, uma espécie de pré-Seminário para recolher vocações sacerdotais, dando assim ensejo à Província Franciscana para o aproveitamento da sua idéia e posterior fundação em Guaratinguetá, cidade paulista, de um Seminário Franciscano. Também, foi um profundor incentivador do teatro religioso, fundando inclusive, em Petrópolis, o Teatro Mariano, de dimensões consideráveis para a época, além de compor inúmeras peças de teatro sacro encenadas até hoje, tão notável é sua qualidade.

Mesmo enfrentando severas limitações físicas, como a progressiva perda da visão e agravamento da diabetes, Frei João José manteve-se ativo em sua missão até seus últimos dias, embora sofresse já com alguma surdez e visão prejudicadas. Transferido para Tremembé em 1961, veio a falecer em 30 de maio de 1962, com gangrena em seus pés.

Rogando que rezassem o terço com ele, sob profunda emoção, teve de suportar com paciência heroica dores dilacerantes, paciência que impressionou a equipe médica, que confessou jamais ter visto tamanha resignação. Morreu o Frei João José repetindo: “Meu Deus e meu tudo. Mãezinha do céu eu não sei rezar, só sei dizer quero te amar, e quero agora ir contigo. Aproxima-se a morte, seja então feita a tua Santíssima vontade”.

Antes de falecer, porém, sabe-se, por inúmeros escritos, que em sua passagem pela Europa o Frei João José teve um episódio místico com Nossa Senhora, ignorado por ele à época por pensar ser fruto de sua enfermidade. Mas este episódio se repetiu mais tarde, quando Nossa Senhora o instou a erigir um trono em Petrópolis. Sob o incentivo da população, em 1947 o frei deu início à obra, solicitando o projeto arquitetônico ao também construtor do Cristo Redentor, Heitor da Silva Costa. A imagem de Nossa Senhora de Fátima, em destaque no centro do monumento, foi esculpida em Pietrasanta, na Itália, por Enrico Arrighini. A estátua é feita em mármore branco, medindo 3,5 m de altura e pesando quatro toneladas. Sobre a cúpula do trono fica a imagem do anjo Gabriel, com 1m de altura. Ao todo, o trono tem 14m de altura. Por fim, por ocasião da inauguração, tanto alguns fiéis observaram nuvens em formato de bouquet (era um dia chuvoso), como também um arco-íris se formou próximo ao local.

Sua vida, marcada por dedicação, erudição e espiritualidade, deixou um legado duradouro na formação teológica e na promoção do estudo das Escrituras no Brasil.

Segundo o Frei Constantino Koser, de quem parafraseamos parte do texto acima,

"Foram quase 25 anos os de professorado de Ciências Bíblicas em Petrópolis. É indiscutível que esta atividade marcou de modo especial a vida e a personalidade de Frei João José. As grandes turmas da Província, nos anos 30 e começos de 40, passaram por sua mão, e são assim muitas dezenas de sacerdotes os que dele receberam a sua formação no que concerne à Sagrada Escritura.

Frei João José foi homem de grandes dotes oratórios. Foram numerosos os sermões vibrantes e bem construídos que pronunciou. Mas preferia uma oratória menos sensacionalista. Via de regra pregava em tom familiar, explicava doutrina, vivia de passagens da Sagrada Escritura, que interpretava magistralmente, com finíssimo colorido de ambiência. Muitos retiros pregou, e para pregá-los levava a Sagrada Escritura, fazia sua disposição e ia falando. A facilidade com que se exprimia e com que ia “tecendo” o seu sermão era tamanha, que por vezes causava a impressão de ser desatencioso. Na realidade, porém, estava impregnado de um profundo sentimento de responsabilidade pela palavra e de acordo com este sentimento agia.

Pode-se dizer que Frei João José se caracterizava pela moderação. Não exagerava, nem gostava de exageros, era muito reservado diante de extravagâncias. No comer, no vestir, no morar, nos objetos de uso, no movimentar-se, no falar, nas exigências, nas relações, em tudo se notava esta forte moderação. Um homem do meio, não dos extremos. Por isso mesmo sua espiritualidade também era de moderação, não de grandes arroubos nem de grandes depressões.

No entanto, o confrade era de têmpera extraordinária de vontade. Com menos têmpera, teria cedido à enfermidade e teria ficado se tratando, esperando a morte. Quantas vezes estava com o teor de açúcar no limite, à beira de estado de coma, exausto, e no entanto continuava intrépido, sem se queixar, sem falar da doença!

Nesta característica geral de moderação se contém ainda a vida interior do confrade, particularmente a oração. Sua vida interior, por ser intensa, era toda de cunho apostólico: o bem das almas não o largava. Daí seu zelo inquebrantável, vencedor de todos os empecilhos que a enfermidade lhe opunha à ação. Da união com Deus e do zelo de almas nascia uma enorme capacidade de dedicação a outros e de amizade.

Alimentava-se mais que tudo da Bíblia. Lia muito e muitos livros, mas lia sempre de novo e tornava constantemente à Sagrada Escritura. A espiritualidade de Frei João José estava inteiramente dominada pela imagem de Deus bom, misericordioso, complacente, compreensivo, mas também justo e Senhor. Para com Deus tinha uma relação muito pessoal, muito intensa, acesso fácil e constante. Vivia “em Deus”.

Frei João José, foi sem dúvida uma das grandes figuras humanas, de confrade, de sacerdote, de professor, de homem de iniciativa, de homem espiritual de nossa Província."

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